quarta-feira, março 31, 2010

O Nome Disso É Dor De Cotovelo

E justamente quando te amo...te perco.

(...)

Aos cinco anos ganhei minha primeira boneca que não era careca. Seu nome era Lina. Até hoje não entendo porque não a batizei de Luisa ou Joana. Respeitei o seu destino e o nome impresso na caixa permaneceu.
Como fomos companheiras! Nunca a emprestei. Nunca a deixei cair no chão.
Lina veio para mim com um defeito: o seu olho direito não mexia. O esquerdo, sim. Mas não quis troca-la. O leve estrabismo fazia com que ela fosse mais minha ainda. Eu seria capaz de reconhecê-la entre todas as outras Linas de vestidinho amarelo nascidas em 91.
Aos sete ganhei uma bicicleta com cestinha e Lina ficou órfã.
A precoce liberdade proporcionada por aquelas duas rodas me seduziu. Saí da varanda de casa e ganhei o asfalto. Eram tardes inteiras fugindo da tarefa de casa, do banho das cinco e da sopa de feijão. Eu só queria mais uma volta. Só mais uma!
Em uma manhã daquelas eu cresci e a bicicleta encolheu.
Quando mudamos de bairro perdi muitas coisas que foram tidas como tralhas. Me dei conta que eu não sabia dizer se Lina tinha sido desumanamente esquecida ou cruelmente doada. Sofri. Sofri. Sofri. Pior do que abandonar é se perder.
Demorei muito para perdoar a mim mesma. Perdoar o meu esquecimento. Eu só estava tentando com os meus pedais ir além do meu quarteirão.

(...)

Eu fico tentando adivinhar em qual dessas curvas a gente se perdeu.Você que era tão meu.
A sorte é que a gente não  perde sempre. Não chora sempre. Não sofre sempre...
...chega uma hora em que precisamos retomar os pedais.  Sempre em frente..enfrente..enfeite.

domingo, março 28, 2010

Na Crista Da Globalização.

Enquanto esperava o ônibus que, pelo adiantado da hora, viria lotado e aos solavancos, me tornei espectadora de um grupo de mullheres e crianças que não sei bem se faziam parte de uma mesma família. Ao tempo que uma jovem gestante desembaraçava o cabelo zangado de uma menina que tinha o pé direito amputado, outra retivara a sandália havaiana do pé e lançava contra a palma da mão de um garotinho até bonitinho que, mais tarde descobri, se tratava do filho da jovem, da gestante. Meio minuto depois, o menino levava à boca a mão "palmeada", transportando entre os dedos os milhares de germes que lhe eram bem familiares.

Eis que surge um vendedor de trident anunciando "dois por um real". Eu achei uma pechincha e prontamente resgatei uma moeda do fundo da bolsa. Neste momento encontro também o outro par de um brinco dado como perdido. Comemorei silenciosa a sorte de tive pelos tridents e pelo velho brinco novo.

Adiante, uma senhora de coque exasperou-se porque o garotinho até bonitinho, enquanto corria irrequieto, atropelou o seu caminho. A mulher das havaianas novamente o repreendeu com uma palmada sonora.

À essa altura, os milhares de germes combatiam com os milhares de anticorpos que o garotinho adquirira ao longo dos seus prováveis sete anos.

O ônibus chegou e mais uma vez fiz todo o trajeto em pé. Nem pude cochilar. Talvez fosse melhor me manter acordada.

Agora estou aqui na aula mascando meu trident de canela, pensando que talvez pudesse ir ao cinema amanhã. Enquanto isso, o mestre, sem platéia, fala sobre a Globalização tal qual meu professor de história do 2° grau. Ainda bem que é sexta, e não, segunda.

quarta-feira, março 24, 2010

Parafraseando.

Drummond, no período entre guerras, escreveu “Poema da Necessidade” que compõe a obra “Sentimento do Mundo”.
Entre as suas prescrições, destacava-se a necessidade de viver com os homens. Sei bem que ele falava da destruição do homem pelo homem com seus fuzis e granadas. Mas que ele, que dorme o sono dos justos desde a década de 80, me permita uma leiga e rasa reflexão.
Em tempos de Orkut, Twiter, MSN e o Escambau. Em tempos de uma vida virtual (vegetal?) não se vive com o corpo inteiro. Nem sempre sentados em posição ergonomicamente correta, devoramos com os olhos e abraçamos com as pontas dos dedos o teclado e o mouse.
A tecnologia que nos informa e nos leva do Alasca ao Japão nos furta o abraço e o toque. Torna mais rara a nossa presença para, in loco, dizer “eu te amo” sem que isso precise constar no meu perfil virtual.
Mas eu também caí na boca do lobo. Eu amo a internet e não posso lutar contra ela que já é parte de mim. Eu só não quero que ela seja um consolo. Meus amigos, minha família, meus casos de amor...eu quero de verdade. Com gosto, cheiro. Sem maquiagem ou trilha musical.
Pronto, Drummond. Eu só queria ratificar que é preciso viver com os homens. Se você estivesse por aqui, certamente lhe enviaria um email para você me ajudar a organizar melhor as palavras. Aliás, não! Faria melhor: iria à Minas para, pessoalmente, lhe mostrar umas coisinhas que tenho escrito. É tudo muito sincero, embora embrionário. Seria uma conversa regada ao cheirinho do pão de queijo que, cordialmente, você me serviria no final da tarde.

terça-feira, março 16, 2010

Pra Falar de Mim ou Ser Mistério de Si Mesmo.

Falar de si próprio é um escape.
Ou se pesa em beleza,
Ou em autopiedade.
E se finge ter certeza
Do que mesmo para nós é segredo.
E seja por rancor ou medo,
Em guerra, só somos defesa.
Eu não falo dos amores de diário
Ou das pequenas vilanias infanfis.
Eu falo do que ao espelho se esquiva
Do que a gente sacrifica
Por ser o extraordinário.
É a parte de si mesmo
Que ao tempo se afina.
É a face nunca dada.
É corte no pulso dos meros mortais.
Eu conheço a epiderme.
Minhas cicatrizes e traumas da infância
Mas as outras camadas...
...estas falam um tanto mais.

domingo, março 14, 2010

Como Seria Se Você Dissesse Sim?

Ontem sofri por um amor de verdade. Um amor consciente.
Nunca lhe quis tanto quanto naquela quinta-feira.
Surpreendente te querer. Logo eu, sedenta por novidade. Em você: nenhuma surpresa. Os mesmos gestos e vícios. O mesmo jeito de calar e sorrir. O cheiro. Os mesmos toques e hálito.
Da leitura precoce de "O Pequeno Príncipe", marcou: "Tu te tornas responsável por aquilo que cativas". E acredito também que por nossas escolhas. Se você tivesse dito "sim", talvez Glauco, cartunista brasileiro, não tivesse morrido na manhã seguinte. Talvez eu não tivesse perdido o ônibus e levado falta na aula de Direito Tributário. E quem sabe Regina fizesse carne para o almoço e não peixe. Ou não. Vai ver que ninguém notaria e o mundo ao redor se manteria passivo, na mesma marcha de sempre...

...mas, e nós?

quarta-feira, março 10, 2010

Eu sou do tempo da minha Vó.


Sou alguém do século passado.
A pior parte dessa descoberta não é se dar conta que estou mais velha, mas sim, ultrapassada. É estranho amargar a indigesta sensação de ser deixada pra trás.
Por outro lado, passo a compreender melhor a minha mãe e até a concordar com ela em várias coisas. Da mesma forma, me preocupo menos em dar desculpas esfarrapadas pra quem quer que seja e tenho andado olhando mais para frente do que para o chão.
Em seguida, percebo que apenas ontem me dei conta da existência dos Jonas Brothers e já ontem, o fenômeno musical juvenil não era tão fenômeno assim.
Certo dia no cinema fiquei levemente irritada com os risinhos vindos do fundo da sala. Eram adolescentes. Logo vi. Engraçado é que, não faz muito tempo, era eu quem, provavelmente, irritava os pagantes e os meio-pagantes que iam ao cinema para (surpresa!) ver o filme.
Neste domingo, entre violão e amigos, cantarolava afinadamente o repertório dos Paralamas e da Legião. E me vi completamente familiarizada com os sucessos que, embora eternos, perderam espaço para os hits sertanejos e agudos de um tal Luan Sacana, digo, Santana.

A sensação que tenho é que as coisas lá atrás eram melhores. Até a coca-cola tinha mais gás. O chandelle também era mais gostoso. Mas a verdade é que as coisas estão, inevitavelmente e incrivelmente, diferentes.

Confesso que não fico triste com o tempo que envelhece em progressão geométrica. Não fosse o problema da gravidade que, de forma cruel, nos mostra a parte azeda de ficar mais velha, o processo seria perfeitamente administrável. Mas esse pepino empurramos com as agulhas enquanto der. Afinal de contas, o Botox, que é uma invenção do século passado, ainda está na moda, graças a Deus.

quinta-feira, março 04, 2010

A minha é "A" positivo.


Mais ou menos na primeira semana de cada mês eu sangro. E isso não é poesia.

Quando a dama de vermelho anuncia a sua primeira visita, morremos de orgulho.
A partir da segunda visita, morremos de raiva.
É muito inconveniente aparecer sem ser convidada ou, o que é pior, sem preparar a anfitriã. Aos poucos as visitas vão se tornando mais regulares e preparamos a casa.
Se atrasa, morremos de medo.
Se chega, enfim, morremos de dor...

...mas se morremos tantas vezes é porque estamos VIVAS! Endometricamente, ovulamente, colicamente, pilulamente, absorventemente, vivas! Amorosamente, sexualmente, lubrificadamente, motelmente, gozadamente, camisinhamente, vivas!

O pior é saber que quando ela se for pra nunca mais dar o ar da graça, morreremos de calor por causa da sua prima, a menopausa, que, inconvenientemente, nos fará visitas periódicas...

...aí, amigas, estaremos ginecologicamente, psicologicamente, impacientemente, ressecadamente, fatalmente, fudidas! (e não é no bom sentido da palavra).

segunda-feira, março 01, 2010

..Em sonho...

A autoria do texto que se segue não é reconhecida como minha. O que é uma injustiça. Mas desconfio que esse homem me visitou em sonho e roubou meus pensamentos, transformando em poesia.
É que as palavras ficam boiando dentro de mim desajustadas, sem rima. Ele teve o trabalho de lapidar meus devaneios tortos. Mas eu sei que a matéria prima é minha e por isso assumo a co-autoria da obra na medida da minha contribuição. Ele é um ladrão-vidente. Revelou à Deus e ao mundo tudo aquilo que eu não conto nem pra mim. Comprometeu, seriamente, a minha confiança nele. Mas deixe estar..da próxima vez ele responderá por plágio e, certamente, será condenado.


...

Falando Sério por Maurício Duboc.

Falando sério
É bem melhor você parar com essas coisas
De olhar pra mim com olhos de promessas
Depois sorrir como quem nada quer

Você não sabe
Mas é que eu tenho cicatrizes que a vida fez
E tenho medo de fazer planos
De tentar e sofrer outra vez

Falando sério
Eu não queria ter você por um programa
E apenas ser mais uma em sua cama
Por uma noite apenas e nada mais

Falando sério
Entre nós dois tinha que haver mais sentimento
Não quero seu amor por um momento
E ter a vida inteira pra me arrepender