segunda-feira, maio 24, 2010

Pega ela aí, pega ela aí.

Enquanto eu digladiava com meus cabelos revoltosos, fazendo mil mabalarismos para fazermos as pazes, minha mãe de cá falou:

 - Alessandra, minha filha, você tem que parar de maltratar o seu cabelo. Assume ele como ele é. Você vai acabar careca.

Primeiro eu tenho que esclarecer que meu cabelo é tal qual um algodão doce. Cheio, leve e sem forma.
Toda noite, já na cama, eu brinco de tentar adivinhar como o meu cabelo vai amanhecer.
Prontamente eu respondi à minha mãe:

- Assumir? Assumir o quê? Por acaso eu cometi algum crime? Estou sendo acusada de alguma coisa e não sei?

Minha mãe fez aquele barulhinho de quem tira sujeira do dente e mergulhou na leitura de "A Cabana", presumindo que eu fosse iniciar um discurso moralizante sobre "A revolta dos cabelos crespos" ou "A mulher negra e o século XXI" . Mas eu não fiz. Me quedei silenciosa e vitoriosa de mim mesma. No íntimo, ela compreendeu que essa tal liberdade, não está em poder desfilar cabelos crespos e volumosos, nem em  tocar livremente os nossos tambores, nem em votar nas próximas eleições, nem em professar a nossa crença nos terreiros, nem em ser eleito presidente dos EUA, nem em ser sujeito de direitos garantidos constitucionalmente, nem em jogar capoeira em praça pública, nem em cantar na Timbalada, nem em ser protagonista da novela das oito.

Liberdade mesmo é poder ser quem se quer ser. Por dentro e por fora. É saber que a nossa vida não é propriedade de ninguém. Nem mesmo o nosso cabelo, genuinamente, historicamente e culturalmente, africano.

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